Cadeia de valor
Para enquadrar a implementação deste novo vetor energético, é importante perceber a cadeia de valor base do biometano:
Matéria Orgânica
Uma grande variedade de matérias-primas pode ser utilizada para a produção de biogás. A natureza da matéria-prima não só tem influência na definição do processo mais adequado para a desconstrução da matéria orgânica alimentada, como também cada processo vai influenciar a composição do gás e o respetivo rendimento.
Resíduos das culturas
Resíduos da colheita de trigo, milho, arroz, outros grãos grosseiros, beterraba sacarina, cana-de-açúcar, soja e outras sementes oleaginosas.
Estrume animal
De gado, incluindo bovinos, suínos, aves de capoeira e ovinos.
Fração orgânica de resíduos sólidos urbanos
Alimentos e resíduos verdes (por exemplo folhas e erva), papel e cartão e madeira que não é de outro modo utilizada (por exemplo, para compostagem ou reciclagem). Os resíduos sólidos urbanos incluem ainda alguns resíduos industriais da indústria de transformação de alimentos.
Lamas de águas residuais
Matéria orgânica semissólida recuperada sob a forma de gás, de esgotos das estações municipais de tratamento de águas residuais.
A maior parte da produção de biometano provém da atualização do biogás, pelo que as matérias-primas são as mesmas que as acima descritas, sendo que grande parte da produção atual provém de culturas e estrume animal. O seguinte gráfico contém a produção de biogás por região e por tipo de matéria-prima, dados de 2018..
Fonte: IEA, Biogas production by region and by feedstock type, 2018, IEA, Paris
Num estudo feito pelo LNEG, foram calculados os volumes potenciais produzidos tendo em conta a disponibilidade dos diferentes tipos de resíduos, resumindo-se na tabela seguinte os valores obtidos bem como o potencial energético associado ao biometano produzido.
Fonte: Avaliação do Potencial e Impacto do Biometano em Portugal
No caso do Bio- SNG, apresentam-se os valores em biometano assumindo que o gás de síntese é sujeito a processos de metanação. Note-se que, ao associar o biogás ao gás de síntese para valorização através da metanação, será possível também produzir o metano a partir do CO2 presente no biogás, o que se traduzirá num maior enriquecimento em metano e numa maior produção em biometano.
Após uma fase inicial em que foram usadas erradamente culturas alimentares, passou-se para o cultivo de plantas herbáceas, substituindo vantajosamente as culturas de alto rendimento e ocupando terrenos marginais.
Estas culturas secundárias, definidas hoje como “culturas energéticas", são colhidas e utilizadas para a digestão anaeróbia. Esta biomassa vegetal tem vantagens, pois proporciona proteção contra a erosão causada pela chuva e pelo vento e propicia uma melhor absorção de água, reduzindo a anaerobiose no solo submerso e a consequente produção e libertação de metano. A agricultura a praticar deve ser fundamentada em rigorosos critérios de sustentabilidade e respeito dos habitats naturais, assegurando igualmente a permanência da biodiversidade.
Em Portugal existe um potencial interessante no cultivo de plantas herbáceas, leguminosas e gramíneas. Em alternância com as culturas principais, é uma prática de uso corrente na agricultura atual de Portugal. Conseguem-se colheitas herbáceas com um rendimento que varia com a cultura, o local, o tipo de solo, a exposição, etc. Nos solos mais férteis do Ribatejo é possível garantir um valor mínimo da ordem das 30 t/ha e, assim, proporcionar uma produção em biometano da ordem dos 8 m3 /ha/dia.
Produção
Pode ser produzido quer através da via de conversão bioquímica (biogás) ou termoquímica (gás de síntese) da biomassa. O biogás (ou o gás de síntese obtido por gaseificação) é produzido a partir de biomassa diversa normalmente com base em resíduos de natureza orgânica de várias proveniências.
A digestão anaeróbia e a gaseificação são processos que se complementam, na medida em que, em conjunto, podem ser aplicados à conversão de grande parte dos efluentes produzidos pelas atuais sociedades, em produtos de utilidade.
Digestão Anaeróbia
A digestão anaeróbia é adequada à degradação de efluentes orgânicos líquidos (esterco animal, resíduos industriais etc.). O tratamento e o aproveitamento energético de dejetos orgânicos podem ser feitos pela digestão anaeróbia em biodigestores, onde o processo é favorecido pela humidade e aquecimento.
O processo corre na ausência de ar, que consiste na decomposição do material pela ação de microrganismos (bactérias acidogénicas e metanogénicas), o aquecimento é provocado pela própria ação das bactérias, mas, em regiões ou épocas de frio, pode ser necessário empregar energia adicional, visto que a temperatura deve ser de pelo menos 35°C.
O produto final é o biogás, composto essencialmente por metano (50% a 75%) e dióxido de carbono.
Purificação e Valorização (Upgrading)
A forma mais utilizada para sua obtenção é a partir do biogás, através de um processo de purificação e valorização que se traduz num processo de limpeza do gás para separação de impurezas (siloxanos, sulfureto de hidrogénio, etc.) e CO2 com o correspondente enriquecimento em metano. As tecnologias mais utilizadas atualmente na Europa são: limpeza de gases com água (WATS); adsorção com variação de pressão (PSA); lavagem química (CHEMS); lavagem física (PHYS); e separação por membranas (MEMS).
O processo mais usado é o de lavagem com água (WATS) em mais de 40%, seguindo-se os processos de adsorção (PSA) e de lavagem química (CHEMS) que, em conjunto, representam 25% das instalações existentes na Europa. O processo menos utilizado é o de separação recorrendo a membranas que representa apenas 4% das instalações.
Gaseificação e metanação
A gaseificação aplica-se aos materiais lenhificados de baixo teor em humidade que normalmente são de difícil e longa decomposição por via biológica.
É um processo de conversão termoquímica, que se processa normalmente a temperaturas acima dos 700º C, podendo atingir os 1000º C, em que a biomassa é sujeita a uma sequência complexa de reações, produzindo-se um gás, normalmente designado por biogás ou gás de síntese.
Depois de obtido o biogás, é necessário um enriquecimento em metano. Este enriquecimento em metano pode ser efetuado mediante um processo designado por “metanação”.
Os processos de metanação existentes elevam o conteúdo de metano a um mínimo de 95%, por meio da conversão do monóxido de carbono (CO) e dióxido de carbono (CO2) em metano por reações químicas com hidrogénio (H2) na presença de catalisadores usualmente à base de níquel e a uma temperatura na ordem de 250º C a 450º C.
Estratégias/Consumidores
Injeção na rede de gás Natural
O potencial do biometano para a descarbonização é bastante relevante. Pode ser injetado diretamente nas infraestruturas do Sistema Nacional de Gás, por ser um gás perfeitamente intermutável, produzido de forma endógena e capitalizando a gestão de resíduos, numa lógica de economia circular.
O Decreto-Lei nº 231/2012 de 26 de outubro, veio estabelecer que as disposições relativas ao acesso à RNTGN, bem como as relativas à comercialização do GN são aplicáveis ao biogás e ao gás proveniente da biomassa, ou a outros tipos de gás, viabilizando a injeção destes nas redes de gás natural, uma vez garantidas as condições técnicas de qualidade e segurança para a injeção destes gases.
Como alternativa à injeção na rede, é possível a sua compressão para introdução em unidades autónomas, para uma distribuição localizada cuja pressão não exceda 4 bar.